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GESTÃO DE CULTURA E ARTE

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POR UM FIO

artista Adriana Affortunati | texto de Francisco Rocha

atuação GROU. Produção executiva e divulgação

A exposição ficou em cartaz de 08 a 22 de outubro de 2022 no espaço da Galeria Gare em São Paulo, SP

Primeira individual da artista no Brasil após 6 anos de experimentações em residências artísticas pela Itália, Canadá, Áustria e Coréia do Sul.

A obra principal, Por um fio, é composta por esculturas de tecido e plástico moldadas e suspensas por fios que parecem se esforçar para se segurar, se agarrando nas paredes para não cair. Outras são esculpidas por fios sem nós, fazendo com que um material macio como o tecido, passe a se sustentar, a se erguer do chão.

Todas em tons de brancos encardidos, as obras criam um diálogo direto com o espaço expositivo, que pelo silêncio cromático ressaltam os detalhes arquitetônicos da Galeria. Vistos de perto, os brancos encardidos parecem coloridos, tamanha variedade de tons encontrados que vão do cinza ao bege
escuro. Além das variações alcançadas pelas explorações da luz, sombra, movimento, volume - questões caras à escultura.



@driaffortunati

www.aaffortunati.com

Design convite @p.u.n.k.t_d @mauro_souza_rodrigues
Galeria Gare @galeriagare
Rua Cubatão, 959 - Vila Mariana - SP/SP


 

Por um fio – exposição de Adriana Affortunati

Texto de Francisco Rocha

 

O ateliê da artista é o salão da vidente. Artevidente, desvela nossa riqueza única: ver, além da túnica do uso, o semblante inquieto da coisa puramente existente. Um olho solitário se choca com as coisas, do qual estas são testemunhas. A coisa, então, se evidencia e olha a gente: vide a vidente.

 

A vidência da artista se torna evidência da vista quando, pela graça de um gesto, por um gesto de graça, o objeto indiviso mostra seu viso vário, e, no visual desavisado, aflora o visionário. Enquanto choque com a matéria, a vidência é presságio sem imagem e dá passagem ao viso vário, no visionário, com um passe de visagem.

 

A artista-vidente cerra as pálpebras e abre as mãos para ver: o que visa, sem aviso, é topado pelo olho tapado da tatilidade, entre apalpos e tateios, pois a visagem – vazão do viso vário – se dá pelo convívio carnal com o material elástico e desistido de velho tecido, de plástico usado: cobrir-se, cheirar, sujar-se, amassar, esticar, rasgar, amarrar, esperar tornar-se. Doravante, o objeto ali está, chocante, a nos olhar, não como objeto achado, mas, pelo choque com o corpo da artista, chocado.

 

Por um fio, se exibe: a amarração sem nó suspende o tecido sem corpo-cabide. Em queda livre, entregue à mera força da gravidade, o tecido cai como a veste do nada, na moleza esparramada, vago ao visual. Com a amarração – serviço de vidente –, o tecido sem corpo-cabide não cai a esmo, cai em si mesmo. E assim, caído em si, o tecido cai bem, dele próprio vestido.

 

No entre-dois vagante de forças adversas – repuxo da gravidade e empuxo da amarração – a insustentável firmeza do tecido é sustada na dobra sobre dobra, barra oca que esbarra noutra. Embora dela derive – a artista refere Bernini –, a barra oca não é, porém, barroca. Barroca, a dobra é liberada pela mediação elementar entre veste e corpo – veja que o fogo drapeja o manto de Santa Teresa. Barra oca, o tecido, que se redobra, sobra só e não sossobra, por um fio, e, assim, sem recobrar o corpo finito, recobre-se retorcido, fazendo-se escultura que transborda a figura e vaga pelo figural. A escultura de barra oca tira sarro da outra barroca, pois se nesta a dobra se gesta pelo fio do talho, aquela ganha o talho de dobra por um gesto de fio.

 

A amarração com fio de cordão ou tira (que do próprio pano se tira) não é mero varal onde o tecido queda sacudido no grau zero de superfície lisa. Sustentadora de estrias, de cordão ou tira, a amarração é pêndulo de enforcado e pedúnculo volátil, e, assim, faz revoar o tecido como acrobata do vácuo, cuja fibra se revira e vibra no ar com ar de viso vário no desvario do olhar visionário: visoviagem via visagem.

 

Noutra fatura, o cordão envolve tecido ou plástico em voluta. A voluta de cordão, contudo, não se amarra com luta ou na marra: com tudo de volúpia mútua, se, por um lado, é conduta de visagem, por outro lado, a voluta é conduto do viço e do bulício contido na matéria antes devoluta. O que se dá por feito são obras e esculturas de diversos feitios e estaturas. Miúdas e dispostas lado a lado em pouquíssimas unidades, umas se dão ares de fetiches em altares, tornando presente ao olho, ainda que cético, o ente místico além do estético. Outras, menos miúdas, se prendem como broches na parede, com formas nunca broxas, antes virtuosas, que se exibem ambíguas ou insólitas. Notem-se, também, os rizomas aéreos cuja expansão, dir-se-ia espontânea, se dilata pelas variantes e volumes de torções vertiginosas ao olhar preso ao costume, agora, num lume, surpreso. A voluta, ainda, quando envolve plástico ou tecido, os volve em bichos graúdos que se revolvem em nossa fauna imaginária.

 

Enfim, dobrando a matéria de velho tecido lívido e opaco plástico usado, Por um fio nos mergulha no silêncio esbranquiçado, refratando, nesse lance, o espaço expositivo. O material, pela dobra da barra oca e da voluta, ganha o volume da carne e também seu colorido ao encarnar, não o encarnado, mas o encardido. Vistos de perto, os brancos encardidos variam da poluta palidez à hepática tez (bege escura) e, daí, ao cinza da carne suja ou pútrida. São tons eleitos, já que a artista não prepara suas tintas, mas com elas se depara nos objetos e materiais sem valimento, já maquiados pela paleta do envelhecimento. Dir-se-ia que, no seu trabalho, a artista toma a própria mão do tempo que urde a figura e esculpe a estatura do que está suspenso, por um fio, no suspense do desabamento




@driaffortunati

www.aaffortunati.com
 

Fotos: Daniela Ramiro @daniramirofotografia
Design convite @p.u.n.k.t_d @mauro_souza_rodrigues

Galeria Gare @galeriagare
Rua Cubatão, 959 - Vila Mariana - SP/SP

 


 

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